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PURIFICAÇÃO DE ÁGUA PARA USO FARMACÊUTICO

  • Foto do escritor: Lincoln Cardoso
    Lincoln Cardoso
  • há 4 dias
  • 11 min de leitura

A água é, sem dúvidas, o insumo farmacêutico mais importante! Porque ela é empregada em muitos processos farmacêuticos nas indústrias de medicamentos e cosméticos, e também nas farmácias de manipulação e em diversos tipos de atividades laboratoriais, como nas análises clínicas. Em um artigo anterior, disponível aqui no Blog Farmacosophia, já foi explicado o que é a água para uso farmacêutico, os seus diferentes tipos e principais especificações. E agora, neste artigo, serão explicados os diversos sistemas e tecnologias de purificação de água para uso farmacêutico. Quer saber?

Assista ao vídeo com este tema.

Conheça agora os diferentes sistemas de purificação de água para uso farmacêutico. Este tema pode parecer de difícil compreensão, mas ao concluir esta leitura você vai conhecer e entender as principais tecnologias, os processos e os cuidados necessários para garantir a qualidade da água utilizada na produção de medicamentos, suplementos alimentares e cosméticos.


A purificação da água para uso farmacêutico é necessária para a eliminação de impurezas físico-químicas, biológicas e microbianas. A água obtida para o uso farmacêutico deve atender às especificações farmacopeicas, de acordo com o uso para o qual se destina. De um modo geral há três tipos de água para uso farmacêutico: a água purificada; a água ultrapurificada; e a água para injetáveis. E para se obter cada um deste tipos de água, são empregadas diferentes tecnologias de purificação. A diferença entre esses processos se baseia no tipo de água a ser produzida, e devem remover bactérias, endotoxinas bacterianas e reduzir a condutividade, de acordo com as especificações.

Os métodos empregados para a obtenção dos diferentes tipos de água envolvem uma sequência de "operações unitárias", que chamamos de estágios de purificação. Cada estágio é projetado para remover contaminantes específicos e, muitas vezes, para proteger os estágios subsequentes. A operação unitária final no processo de produção da água para injetáveis é a destilação, ou outro processo semelhante ou melhor. Este processo deve remover substâncias químicas indesejáveis, bem como microrganismos e possíveis substâncias produzidas por eles. Mas, além da destilação, outras técnicas podem ser adotadas na etapa final de produção da água para injetáveis, como a ultrafiltração e a osmose reversa, desde que devidamente validadas.

As instalações de um sistema de purificação de água para uso farmacêutico devem ser planejadas considerando a qualidade da água fornecida pela rede de abastecimento; a especificação da água a ser obtida; a vazão necessária; a distância entre o sistema de purificação e os pontos de uso; o traçado da tubulação e as conexões; e o material empregado na estrutura, inclusive no reservatório de abastecimento. A facilidade de assistência técnica e de manutenção, bem como os instrumentos apropriados para o monitoramento do processo, também devem ser levados em conta. Eu vou apresentar esses métodos de purificação em uma ordem sequencial de aplicação. Mas a decisão sobre quais processos serão usados, e a ordem em que serão aplicados, dependem da qualidade da água potável de entrada e do tipo de água a ser produzida.

 

Pré-filtração com areia

 

O primeiro sistema é a pré-filtração, também conhecida como filtração de profundidade ou filtração inicial. Neste processo é usado um pré-filtro que remove contaminantes na forma de partículas, com tamanho na faixa de 5 a 10 µm. Esse sistema serve para proteger os equipamentos das etapas seguintes do processo de purificação. Estes pré-filtros são constituídos de areia especial para filtração, ou pela combinação de outros elementos filtrantes de caráter mais grosseiro.

 

Pré-filtração por adsorção com carvão vegetal ativado

 

O próximo sistema é a pré-filtração por adsorção com carvão ativado. Essa técnica se fundamenta na propriedade do carvão vegetal ativado capturar, por adsorção, moléculas de compostos orgânicos e outros contaminantes, como as cloraminas. Este processo também remove agentes oxidantes por redução química, em especial o cloro livre, que interfere e danifica as próximas etapas do sistema de purificação, principalmente os equipamentos que adotam membranas de filtração, como a osmose reversa e a ultrafiltração. A remoção de agentes sanitizantes da água pelo método de adsorção com carvão ativado pode facilitar o crescimento de microrganismos e a formação de biofilme nas superfícies das tubulações e equipamentos subsequentes. Por isso, é necessário realizar a sanitização do próprio carvão vegetal ativado que abastece este filtro. Isto é feito pela aplicação de vapor direto ou água quente, por exemplo. Seguido do controle de partículas e da contagem microbiana da água que parte desta etapa.

 

Tratamento com aditivos químicos

 

Aditivos químicos também podem ser adicionados à água, depois das etapas de pré-filtração e antes do sistema principal de purificação. Estes produtos químicos servem para ajustar o pH ou para remover carbonatos e amônia. E também protegem as próximas etapas e equipamentos do sistema de purificação, como a osmose reversa. Um dos aditivos utilizados é o ozônio, que serve para eliminar alguns microrganismos. E também o metabissulfito de sódio, que age como agente redutor, principalmente para a remoção de cloro livre ou cloraminas após a etapa de desinfecção do sistema com cloro ou hipoclorito de sódio. Os aditivos químicos empregados devem ser necessariamente removidos em algum estágio posterior do sistema de purificação, e não podem deixar resíduo na água final.

 

Tratamento com abrandadores

 

O tratamento com abrandadores se baseia no uso de resinas regeneráveis de troca iônica capazes de capturar íons cálcio (Ca²⁺) e magnésio (Mg²⁺), bem como liberar íons sódio (Na+) na água. Este processo serve para o tratamento da chamada “água dura”, que nada mais é do que uma água com alta concentração de íons divalentes, principalmente Ca²⁺ e Mg²⁺, que geralmente ocorrem na forma de sais solúveis como bicarbonatos, cloretos e sulfatos.

 

A água dura é aquela que contém concentrações elevadas de íons divalentes, principalmente Ca²⁺ e Mg²⁺, os quais interferem negativamente em processos críticos de purificação, limpeza e formulação. Esses íons podem formar precipitados com reagentes, reduzir a eficiência de detergentes, gerar incrustações em caldeiras e sistemas de osmose reversa, além de comprometer a qualidade da água purificada exigida pelas farmacopeias. Por isso, sua remoção é etapa essencial no tratamento da água destinada ao uso farmacêutico.

 

O equipamento consiste em uma coluna contendo resina catiônica sulfonada na forma sódica. Esta coluna está instalada dentro de um sistema que a reveste e contém a água introduzida sob pressão. À medida que a água passa pelo sistema e entra em contato com a resina, os cátions divalentes de Ca²⁺ e Mg²⁺ são retidos e substituídos por íons Na+ que passam para a água, resultando em uma água com menor dureza. Quando a resina fica saturada com íons Ca²⁺ e Mg²⁺, ela deve ser regenerada com uma solução de cloreto de sódio (NaCl), ou salmoura. O que restaura a sua capacidade de troca iônica. A etapa de tratamento por abrandamento é automatizada e controlada por válvulas multivias e temporizadores, com monitoramento da condutividade para avaliação da dureza residual. Embora o abrandador não remova partículas, microrganismos ou matéria orgânica, este sistema pode ser necessário para proteger as etapas subsequentes – como a osmose reversa – contra a sobrecarga iônica e incrustação. Também é necessário controlar a contagem microbiana neste aparato, mantendo a regeneração frequente da coluna e aplicando a recirculação de água, ou outros meios para reduzir a contagem microbiana e evitar a formação de biofilme no interior do equipamento e na tubulação que segue adiante.






 Deionização e eletrodeionização contínua

 

A deionização e a eletrodeionização contínua são os próximos métodos de purificação de água para uso farmacêutico. Estes equipamentos podem ser acoplados ao sistema, logo após o tratamento por abrandamento, ou mesmo substituí-lo, dependendo das especificações da água purificada a ser obtida. A deionização e a eletrodeionização contínua são tecnologias eficazes para a remoção de sais inorgânicos dissolvidos na água. Mas, embora estes métodos sejam parecidos com o tratamento por abrandamento, há diferenças marcantes entre eles. No abrandamento ocorre a remoção apenas de íons que causam dureza da água, principalmente Ca²⁺ e Mg²⁺. E nos processos de deionização e eletrodeionização ocorre a retirada de praticamente todos os íons dissolvidos na água – tanto os cátions, como Na⁺, Ca²⁺, Mg²⁺ e ferro nas formas formas ferrosa (Fe²⁺) e férrica (Fe³⁺); quanto os ânions cloreto (Cl⁻), sulfato (SO₄²⁻), nitrato (NO₃⁻) e bicarbonato (HCO₃⁻). Assim, os processos de deionização produzem uma água com baixa condutividade e maior pureza, em relação ao tratamento com abrandadores.


Os processos de deionização e eletrodeionização purificam a água por meio de resinas de troca iônica específicas para cátions, ânions ou mistas. Estas resinas são polímeros orgânicos, geralmente sulfonados, na forma de pequenas partículas. As resinas catiônicas capturam os íons liberando o íon hidreto (H⁺) na água; ao passo que as resinas aniônicas liberam hidróxido (OH⁻). Os equipamentos deionizadodres ou eletrodeionizadores geralmente possuem um condutivímetro acoplado, para o monitoramento da condutividade da água produzida. As colunas deionizadoras catiônicas podem ser regeneradas com ácidos, e as colunas aniônicas com bases. Essa técnica isolada não produz uma água de altíssima pureza, porque ocorre a fuga de pequenos fragmentos das resinas para a água. E também há certa facilidade para o crescimento microbiano, além de não serem plenamente eficientes para a remoção de compostos orgânicos. O sistema de eletrodeionização contínua, especialmente, combina resinas catiônicas e aniônicas com membranas semipermeáveis e a aplicação de um campo elétrico, promovendo a remoção de íons de forma contínua. Por isso, não é necessário realizar a regeneração da coluna. Em ambos os casos é necessário ter um controle sobre a geração de partículas, além da ocorrência de microrganismos. Isso pode ser realizado pelo controle das regenerações, no caso da deionização convencional, aplicando recirculação da água e radiação ultravioleta para o controle microbiano na saída. Mas a eficácia destas medidas precisa ser comprovada e validada.

 

Osmose reversa

 

E um dos métodos mais eficazes de purificação de água para uso farmacêutico é, sem dúvida, a osmose reversa. Este processo é muito curioso, porque ele se baseia no princípio da osmose invertida! A osmose é um processo físico pelo qual ocorre a passagem espontânea de um solvente – que geralmente é a água – através de uma membrana semipermeável. Esta passagem acontece do meio menos concentrado (hipotônico) para o mais concentrado (hipertônico), com o objetivo de equilibrar as concentrações em ambos os lados do sistema.


Em um sistema regido por osmose espontânea a tendência é ocorrer um equilíbrio de concentração. Observe na imagem que, após o fenômeno da osmose, ocorre um equilíbrio de concentração entre os dois lados do sistema.

 


A pressão osmótica é a força mínima que deve ser aplicada sobre a solução mais concentrada para impedir a passagem da água pela membrana, ou seja, para interromper a osmose. Trata-se de uma grandeza físico-química que depende da concentração da solução e da temperatura do sistema.

 

Na osmose reversa é aplicada uma pressão que impulsiona a água contra a membrana semipermeável, de modo que a força aplicada vence a pressão osmótica natural. Assim, a água é pressionada a atravessar a membrana no sentido inverso da osmose espontânea, ou seja, do lado hipertônico para o lado hipotônico. Isso faz com a que a água atravesse a membrana, ao passo que as impurezas ficam retidas. Assim, a membrana semipermeável de um sistema de osmose reversa permite a passagem de moléculas de água, mas impede a passagem de solutos com elevado peso molecular, íons, microrganismos e endotoxinas bacterianas.


O sistema de osmose reversa remove de 90 a 99% da maioria dos contaminantes, e não envolve reações químicas. Mas, o desempenho do sistema depende de algumas variáveis, como o pH; a pressão diferencial ao longo da membrana; a temperatura do sistema; o tipo de polímero da membrana; e a estrutura e o material do cartucho que contém a membrana semipermeável. A membrana de osmose reversa deve ser devidamente controlada quanto à formação de incrustações, principalmente de sais de Ca²⁺ e Mg²⁺. E também quanto à formação de biofilme, que é uma fonte crítica de contaminação microbiana e de endotoxinas. A próxima figura demonstra um esquema geral de um sistema de purificação de água para uso farmacêutico por osmose reversa. É necessário que haja um aparato de pré-tratamento acoplado ao equipamento, antes do cartucho de osmose reversa. Esse pré-tratamento é constituído por dois filtros: um de polipropileno e outro de carvão vegetal ativado; além de uma coluna abrandadora. Este aparato remove partículas, alguns contaminantes microbiológicos e agentes oxidantes que podem comprometer o correto funcionamento da membrana semipermeável.



Também podem fazer parte de um sistema de purificação de água para uso farmacêutico outras tecnologias filtrantes que operam com membranas. Estes equipamentos podem ser empregados isolados ou combinados. Uma ou mais destas tecnologias filtrantes complementares podem ser instaladas em uma etapa intermediária do sistema de purificação de água, ou mesmo ao final do processo. E podem ser basicamente de três tipos: ultrafiltração; filtração com carga eletrostática; e microfiltração. Estes sistemas são montados em colunas filtrantes com características específicas para cada tipo de filtração. E precisam ser validados, bem como monitorados quanto à sua eficiência e segurança.

 

Ultrafiltração

 

A ultrafiltração serve para remover endotoxinas da água, e emprega uma membrana especial com a propriedade de reter moléculas conforme o seu peso molecular e aspectos estereoquímicos das moléculas contaminantes.

 

Filtração com carga eletrostática


A filtração com carga eletrostática emprega uma membrana carregada com cargas elétricas positivas na sua superfície. Este tipo de filtração é recomendado para reduzir os níveis de endotoxinas cujas moléculas possuem carga elétrica negativa. Essa tecnologia não é eficaz para a remoção de microrganismos. E pode sofrer saturação da membrana, que ocorre quando as cargas elétricas estão totalmente neutralizadas pela captura das endotoxinas, resultando na interrupção do processo de purificação. Por isso, esses filtros com carga eletrostática são extremamente difíceis de validar, já que não é fácil prever quando a membrana estará sobrecarregada.

 

Microfiltração

 

Este método é utilizado para a retenção de microrganismos. A sua tecnologia emprega membranas microporosas, com poros que variam de tamanho entre 0,2 e 0,22 micrometros. Os equipamentos de microfiltração devem ser validados quanto à sua capacidade de retenção, por meio de um teste bacteriológico que determina o valor da redução logarítmica dos microrganismos pelas membranas. A microfiltração é recomendada para a filtração de gases, ou ventilação de tanques de armazenamento, para evitar a contaminação da água neles contida. Nesses casos, são adotadas membranas hidrofóbicas, para que o filtro opere sem acumular água condensada, a partir da umidade do próprio ar.



Tratamento com radiação ultravioleta (UV)

 

E outra técnica complementar de purificação de água é o tratamento por radiação UV. A radiação UV é utilizada em sistemas de purificação de água em dois comprimentos de onda. Os comprimentos de 185 e de 254 nm promovem oxidação de compostos orgânicos, reduzindo a sua concentração conforme as especificações. E ainda, o comprimento de onda de 254 nm exerce ação germicida e reduz a contagem microbiana. Para se obter um ótimo resultado de oxidação de compostos orgânicos contaminantes, o equipamento de radiação UV deve estar instalado no estágio final do sistema de purificação. E é necessário monitorar a intensidade da lâmpada emissora de UV, bem como considerar a profundidade e a espessura do leito e o fluxo de água no local de aplicação da radiação.


Destilação

 

E a destilação completa o conjunto de tecnologias de purificação de água para uso farmacêutico. Este método físico se baseia na vaporização da água líquida por meio de aquecimento controlado, seguida da condensação do vapor em um sistema separado, isento de contaminantes. Ao atingir o ponto de ebulição, a água passa para a fase gasosa, enquanto impurezas não voláteis como sais inorgânicos, partículas, endotoxinas e a maioria dos microrganismos permanecem no líquido residual. O vapor gerado é então conduzido por um condensador, onde se resfria e retorna ao estado líquido, já com alto grau de pureza. Esse princípio de separação por diferença de volatilidade torna a destilação eficaz na remoção de contaminantes iônicos, orgânicos não voláteis e microrganismos. Existem aparelhos destiladores de água para atender a diferentes dimensões de produção. Em laboratórios e farmácias de manipulação, podem ser usados os aparelhos destiladores tipo Pilsen instalados de forma integrada ao sistema de pré-tratamento da água.


Nas indústrias químicas, farmacêuticas e cosméticas pode haver destiladores simples, de múltiplos efeitos e os de compressão de vapor, que são usados, em geral, para sistemas de produção de grandes volumes. Os equipamentos industriais são bem grandes, e exigem cuidados especiais na sua instalação e manutenção, devido ao seu porte e capacidade de produção.


A água que alimenta os equipamentos destiladores precisa receber um controle diferente daquele adotado para os sistemas de osmose reversa. Porque, na destilação, a concentração de silicatos é muito elevada e crítica, como ocorre em qualquer sistema de geração de vapor. Também pode ocorrer o carreamento de compostos voláteis no condensado, a exemplo de compostos trihalometanos e gases dissolvidos na água, como o dióxido de carbono e a amônia. Por isso, é necessário manter um rigoroso controle da água potável de entrada, bem como da água purificada produzida por destilação.


Estes são os sistemas e tecnologias mais empregados na purificação da água para uso farmacêutico. Estes aparatos e equipamentos geralmente são empregados de forma combinada e integrada, com o propósito de compor um sistema capaz de otimizar o processo de purificação e obter uma água que atenda às especificações farmacêuticas estabelecidas.

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